O ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz recebeu mais de R$ 2 milhões em 483 depósitos feitos por 13 assessores ligados ao hoje senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), na época deputado estadual, segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ). A defesa nega as acusações.
As informações, obtidas por meio da quebra de sigilo bancário, constam na decisão do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Rio, que deu origem a uma operação deflagrada nesta quarta-feira (18). O MP cumpriu 24 mandados de busca e apreensão na investigação sobre um esquema de “rachadinha” na Assembleia Legislativa do RJ (Alerj).
São investigados Queiroz, outros ex-assessores de Flávio Bolsonaro e nove parentes de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, que foram empregados no gabinete de Flávio.
A TV Globo teve acesso ao pedido de medida cautelar de busca e apreensão e quebras dos sigilos fiscal, bancário e telefônico de 33 pessoas físicas e jurídicas. O documento do MP, entregue a justiça, detalha o suposto esquema de corrupção.
Organização formada em 2007
Segundo o MP, diante das investigações de transações imobiliárias e dados de instituições financeiras, existem provas sobre a prática de crimes de peculato, que é desvio de dinheiro público, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os promotores afirmam que a organização criminosa foi formada em 2007 por dezenas de servidores da Alerj.
O MP afirma ainda que dados confirmam que Fabrício Queiroz arrecadou grande parte da remuneração de "funcionários fantasmas" do então deputado estadual Flávio Bolsonaro.
Foram identificados pelo menos 13 assessores que repassavam parte do salário à Queiroz. Ele recebeu 483 depósitos na conta bancária, que somados atingem R$ 2.062.360,52.
Seis grupos e quatro núcleos
O documento divide os suspeitos de terem maior relevância nesta organização em seis grupos:
- O primeiro é formado por Queiroz, sua mulher, Márcia Aguiar, as filhas dele e ex-assessores;
- O segundo é integrado por Adriano Nóbrega, o capitão Adriano, suspeito de pertencer ao grupo de milicianos conhecido como "escritório do crime";
- O terceiro contém ex-assessores que sacavam os salários em espécie para repassar para organização;
- O quarto grupo é composto pelo sargento da PM Diego Ambrósio e sua empresa de vigilância;
- O quinto envolve Alexandre Santini, sócio de Flávio Bolsonaro na empresa Bolsotini Chocolates e Café;
- O sexto é composto por Glenn Dillard e sua consultora envolvida em lavagem de dinheiro mediante aquisição subfaturada de imóveis.
- O primeiro núcleo, o de Queiroz, tinha a função de nomear pessoas para ocupar cargos em comissão na Alerj ou mantê-los nos cargos em troca do repasse de parte dos vencimentos;
- O segundo, do capitão Adriano, era composto por operadores financeiros com a tarefa de recolher e distribuir os recursos públicos desviados do orçamento da Alerj;
- O terceiro eram pessoas que concordaram em ser nomeadas como assessores da Alerj sob o compromisso de repassar mensalmente parte do salário à organização criminosa. Além do sargento Ambrósio e de Glenn Dillard.
- O quarto núcleo contava com a participação de Alexandre Santini, sócio de Flávio Bolsonaro, apontado como líder da organização. Este núcleo, segundo o MP, lavava parte dos recursos desviados da Alerj.
De acordo com os investigadores, quase R$ 3 milhões foram sacados da conta de Queiroz e que a "quantidade predominante de operações em 'dinheiro vivo' não ocorreu por mera coincidência, mas sim com a finalidade de ocultar a origem e o destino do dinheiro". Segundo o MP, ainda não foi identificado de onde saíram mais de R$ 900 mil em depósitos.
Operação
A investigação da suspeita de que havia a "rachadinha" -- um esquema de repartição de salários -- no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj começou há quase 2 anos. O filho do presidente foi deputado estadual por quatro mandatos.
Uma das buscas desta quarta foi em uma loja de chocolates que tem entre os donos Flávio Bolsonaro – o MP suspeita que ela tenha sido usada para lavagem de dinheiro.
O endereço fica em um shopping na Barra da Tijuca, na Zona Oeste. A porta teve que ser arrombada porque a loja ainda estava fechada quando os agentes chegaram. Foram recolhidos relatórios de contabilidade.
Os promotores suspeitam que parte dos recursos desviados da Alerj possa ter sido lavada por meio do empreendimento comercial que o então deputado estadual abriu no inicio de 2015.
Os promotores dizem que ao que tudo indica a pessoa jurídica da franquia foi usada como conta de passagem. Eles afirmam que depois que entravam na empresa, os créditos espúrios retornaram a Flávio Bolsonaro como distribuição de lucros, dando aparência lícita ao enriquecimento ilícito dos sócios entre 2015 e 2018.
Ao analisar os dados bancários, os promotores também identificaram que, apesar de não figurar no contrato e nem como sócia da loja de chocolates, a esposa de Flávio, Fernanda Bolsonaro, fez transferências bancárias arcando com dívidas do marido na empresa.
Os promotores dizem que a figura do sócio que de fato não arca com recurso próprios para a sociedade levanta a suspeita que o outro dono da loja, Alexandre Santini pode ter atuado como laranja do casal Bolsonaro na aquisição da franquia de venda de chocolate.
Com as apreensões, o MP espera encontrar mais provas sobre atuação da organização criminosa.
Coaf e Receita Federal
A ação foi realizada após o Supremo Tribunal Federal (SFT) autorizar o compartilhamento de dados do Conselho de Atividades Financeiras (Coaf) e da Receita Federal com o Ministério Público sem autorização da Justiça.
Em julho, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, suspendeu a investigação. Ele atendeu a um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro, que reclamou que as informações usadas pela Coaf não tinham autorização da Justiça. No início de dezembro, o Supremo liberou o compartilhamento de informações e a investigação recomeçou.
Por G1
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